Porto Ferreira "A Capital da Cerâmica" Da Industria Oleira a Cerâmica Artística

Porto Ferreira


Nós, ferreirenses, orgulhamo-nos de falar de Porto Ferreira como sendo a "Capital da Cerâmica" do Brasil. Mas, muitos desconhecem o processo histórico que nos elevou a este patamar, pois, em 16 de outubro de 2017 foi assegurado o título ao município de "A Capital Nacional da Cerâmica Artística e de Decoração", pela Lei 13.492/2017, publicada no Diário Oficial da União em 17/10/2017. Assim, cabe-nos conhecer estes fatos históricos para compreender o processo que levou ao reconhecimento nacional do município.

A economia cafeeira, pautada por relações capitalistas de produção, proporcionou os "pré-requisitos fundamentais ao surgimento do capital industrial e da grande indústria". Entre 1888 e 1900, entraram 1.400.000 imigrantes no país, dos quais 890.000 se fixaram em São Paulo e foram construídos milhares de quilômetros de trilhos de trem para escoarem a produção.

Com o aumento da população no Estado de São Paulo, criou-se grande demanda por produtos manufaturados e por materiais para a construção de moradias. As empresas localizavam-se próximas à fonte de matéria-prima.

Em 1901, Bandeira tentou fazer um levantamento do número de empresas em todo o Estado de São Paulo. Constatou a existência de 170 fábricas, das quais 50 possuíam mais de 100 funcionários; existiam 17 fiações e 7 fundições, as demais, dividiam-se entre olarias, fábricas de cimento, açúcar, farinha de trigo, drogas, objetos de vidro, sapatos, roupas feitas e papel.

A indústria cerâmica, formada por olarias, fábricas de louças de barro e de louça branca, foi uma das primeiras a se desenvolver no Estado de São Paulo, no final do século XIX e início do século XX. Segundo Bellingieri (2005), as olarias constituem-se o marco inicial do setor, "[...] presentes em quase todas as cidades e núcleos urbanos de São Paulo, desde as últimas décadas do século XIX". Tratavam-se de unidades produtoras de telhas e tijolos, enquanto as cerâmicas fabricavam produtos mais "sofisticados", como manilhas, tubos, potes, talhas, entre outros.

Como referência para a compreensão estrutural de Porto Ferreira nas primeiras décadas do século XX, vale a pena citar algumas informações retiradas de um artigo sobre o município em questão, publicado no "Almanaque Lammert", em 1905. Porto Ferreira contava com 11.500 habitantes e cultivava, principalmente, as culturas de café e cana-de-açúcar. Existiam 1 Grêmio Dramático e Literário, 1 cadeia, 2 farmácias, 1 tipografia, 2 hotéis, 3 sapateiros, 3 alfaiates, 4 cerâmicas de tijolos, 3 cervejarias, 2 ferreiros, 1 funileiro, 2 barbeiros, 1 filarmônica, 1 fotógrafo, 2 lojas de marcenaria, 2 padarias, 6 lojas de fazendas e 15 armazéns de secos e molhados. Os termos cerâmicas e olarias se confundem nos textos históricos, entretanto é possível constatar a presença de cerâmicas já em 1905 em Porto Ferreira.

Um anúncio da Coletoria Estadual de Porto Ferreira, publicado em 25/03/1928 no jornal "O Ferreirense", relata-se as empresas existentes que se encontram citadas: 4 olarias – Ângelo Ramos, João Mutinelli, Pedro Pereira de Araújo, Paschoal Gentil; 1 cerâmica – Fábrica de Louças S.A.

Em 1937, as cerâmicas representavam 10% das empresas do Estado com 1.157 empresas, tornando-se a 3ª maior empregadora com 12.225 operários, atrás do setor têxtil (89.358) e de madeira (15.401), em quarto lugar, vinha a indústria alimentícia empregando 10.767 funcionários.

Segundo dados do Departamento Estadual de Estatística, no ano de 1945, dentre as indústrias relacionadas do município de Porto Ferreira, constavam sete empresas cerâmicas (tijolos e telhas), uma cerâmica de isoladores elétricos (do Syrio Ignátios) e uma cerâmica de pratos, xícaras e louças em geral (Cerâmica Porto Ferreira), de um total de trinta e duas empresas cadastradas.


Segundo reportagem da Revista do Cinquentenário, em 1946, Porto Ferreira contava com:

Uma grande fábrica de louça, 1 fábrica de isoladores elétricos, 1 fábrica de mosaicos, 1 fábrica de brinquedos, 1 fábrica de móveis, 1 fábrica de cera para assoalhos e pasta para calçados, 1 usina de beneficiamento de algodão, 3 máquinas de beneficiar arroz, 13 olarias, 1 lapidação de pedras preciosas,1 colchoaria, 1 torrefação de café, 4 moinhos de fubá, 2 oficinas mecânicas, 1 posto de refrigeração de leite, 3 empresas de exploração de areia e pedregulho, 3 oficinas de ferreiro, 2 oficinas de carpinteiro, 2 institutos de beleza, 1 médico e 2 dentistas. [...] Conta o comércio com 3 farmácias, 7 lojas de fazendas, 9 armazéns de secos e molhados, 2 açougues, 3 padarias, 5 sorveterias, 4 alfaiatarias, 1 tipografia, 3 leiterias, 12 bares e botequins, 6 barbearias, 1 selaria, 1 posto de gasolina, 2 sapatarias, 1 hotel e 1 pensão.

Já os dados do Conselho Nacional de Estatísticas, do ano de 1952, apontam a existência de trinta e cinco empresas em Porto Ferreira, das quais vinte e cinco pertenciam ao setor da indústria de transformação de minerais não metálicos, demonstrando a força do setor na economia local. Deste total, constam sete empresas localizadas na Chácara São José, próxima a estação de trem da Fepasa, das quais seis eram cerâmicas e uma pertencia ao setor de indústria extrativa – possivelmente dedicava-se à extração de argila das várzeas do rio Mogi Guaçu, matéria-prima da produção de tijolos.


Década de 50: A Onda de Progresso


Em virtude do rápido processo de urbanização e crescimento das indústrias, inevitavelmente, ocorreria um aumento por parte do governo nos investimentos em infraestrutura, tanto no planejamento quanto na execução das obras.

A década de 1950 marcou profundamente a história de Porto Ferreira, como uma onda de progresso. A cidade sofreu um rápido desenvolvimento, concentrando-se muitos investimentos em infraestrutura, amparados pelas ações do Governo do Estado de São Paulo, em virtude do intermédio do ferreirense, Dr. Erlindo Salzano, Vice-Governador do Estado (1951-1954).

Certamente, a obra mais relevante do período, para o futuro do município, foi a construção da estrada asfaltada "São Paulo-Igarapava", conhecida como "Via Anhanguera". Esta rodovia diminuiu drasticamente o tempo de deslocamento dos produtos e das pessoas entre Ribeirão Preto e São Paulo - um dos principais eixos econômicos do Brasil, substituindo o transporte ferroviário.

Com o fim de dar dimensão às ações do Vice-Governador, sem aprofundar o assunto, no jornal "O Ferreirense", de 14 de setembro de 1952, no artigo "Porto Ferreira e Dr. Erlindo", está escrito:

"A nova caixa d"água, no alto da cidade, com seus enormes canos, o aeroporto, a cidade nova, as fábricas, as avenidas, os aterros, a estrada asfaltada, o Jardim Primavera, a piscina, a Escola Profissional, enfim, tudo o que de novo e belo existe em nossa terra, é lembrar do Dr. Erlindo".

Em 10 de agosto de 1952 "O Ferreirense" estampava em suas páginas a informação de que 10 máquinas, moto niveladoras e tratores, próximos a Porto Ferreira, haviam iniciado os trabalhos para abrir a estrada de rodagem asfaltada, ligando Ribeirão Preto à capital do Estado de São Paulo. Existia a esperança da rápida conclusão "tão sonhada e esperada estrada asfaltada". Naquele ano, o progresso era vigente no município.

As 34 olarias instaladas não venciam as encomendas da cidade e os pedidos de outros centros vizinhos, em decorrência dos 150 prédios em construção. Em 14 de dezembro de 1952, "O Ferreirense" fez a seguinte colocação:

"Acaba de ser feito o levantamento aerofotogramétrico do traçado de Porto Ferreira-Ribeirão Preto na rodovia estadual São Paulo Igarapava. [...] A rodovia estadual asfaltada, que já está alcançando Araras, continua em seu ritmo acelerado e tudo faz crer que em breve teremos a nova estrada que passa no alto da "cidade nova" e "Jardim Primavera", pronta e aberta para o trânsito."


Escola Artesanal

De acordo com o trabalho acadêmico do Professor Reginaldo Archanjo, o Srs. João Teixeira, Manoel da Silva Oliveira e José Calos de Macedo Soares conseguiram a criação do Decreto de Lei 17.087 para a criação do Curso Prático de Ensino Profissional em Porto Ferreira. Em 14 de Setembro de 1946, o Curso Prático de Cerâmica já estava criado. A Escola Artesanal começou a funcionar em 16 de Novembro de 1950. Em Abril de 1953 foi inaugurado o prédio novo da Escola Artesanal, onde atualmente funcionam o Centro de Especialidades Médicas "Dr. Américo Montenegro" e a Secretaria de Saúde. Havia os cursos de corte e costura, de serviços domésticos e de cerâmica e decoração. Em 1963 as Escolas artesanais foram transformadas em Escolas Industriais. Assim, muitos alunos saíam com as qualificações para exercer o ofício de ceramista.


Cerâmica Porto Ferreira

A maior empresa de Porto Ferreira durante muitas décadas foi a "Cerâmica Porto Ferreira". Criada em 1921, como Fábrica de Louças produzia faianças, louças de mesa branca. Na década de 50, através de um financiamento de 6 milhões de cruzeiros, conseguido graças ao bom relacionamento de Syrio Ignátios, político e empresário local, com Horácio Lafer, político e empresário do ramo de papel. Com o capital emprestado, foram importados maquinários (bens de produção) dos Estados Unidos. Em 1953, a Cerâmica Porto Ferreira contava com 600 empregados, capital de 18.000.000,00, com o ativo total de 40.000.000,00 de cruzeiros, ocupava um área de 16000 metros quadrados e sua produção atingiu 10 milhões de peças. Em 1957, um novo empréstimo completou o ciclo de expansão, aumentando em oito vezes a capacidade produtiva da empresa, que passou a liderar o mercado nacional de louça branca de mesa. No final da década de 80, a empresa parou de produzir faiança e passou a se dedicar somente ao ramo de revestimento cerâmico.

Aos poucos, surgiram novas fábricas cerâmicas advindos de ex-funcionários da CPF, ao perceberam o potencial do negócio pela alta demanda do produto de cerâmica artística de decoração e, também, provenientes da escola artesanal. Vale salientar que a própria Cerâmica Porto Ferreira criou a "Cerâmica Artística Forjaz, que funcionou entre as décadas de 50 e 60".


As Cerâmicas Artísticas


A transição da ênfase econômica das olarias para as cerâmicas artísticas ocorreu na década de 70. A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – CETESB, criada em 24 de Julho de 1968, inibiu a exploração dos "barreiros" para a retirada da argila utilizada pelas cerâmicas oleiras, dificultando a atuação deste setor econômico. Passou a ser necessário um licenciamento ambiental para exploração das várzeas dos rios e retirada do barro.

Segundo o site da Cerâmica Burguina, na década de 80 ocorreu o "boom" das cerâmicas em Porto Ferreira. "Em 1986 a cidade contava com 108 fábricas de cerâmica artística cadastradas na prefeitura. Há relatos de que a quantidade total destas empresas adicionando as informais chegava em mais de 250". Porém este período de fartura afetado entre 1990 e 1992 em decorrência de medidas tomadas pelo Plano Collor.

Fato inusitado ocorreu em Agosto de 1991, quando o prefeito da cidade de Blumenau proibiu a entrada das "canecas-seio" na tradicional "Oktoberfest", que ocorreu entre 11 e 15 de Outubro. A caneca-seio, produzida pela Cerâmica Guiomar, tem um formato de seio o líquido pode ser tomado pelo bico. O fato é que a ocorrência gerou grande repercussão na mídia e a "caneca-seio", que já era produzida há 3 anos, passou a ser um sucesso de vendas em todo o país.

Por fim, torna-se possível compreender, historicamente, que Porto Ferreira adquiriu um caráter industrial desde o começo do século XX, focado na indústria oleira e, posteriormente, dentro de uma economia mais complexa, após a década de 50, desenvolveu uma das suas vertentes econômicas ancoradas na produção e comercialização de cerâmicas artísticas e de decoração, merecendo, portanto, o título de "Capital Nacional da Cerâmica Artística e de Decoração". Foi durante a década de 70 que o Prefeito Municipal Dorival Braga passou a utilizar a terminologia "Capital da Cerâmica" para se referir a Porto Ferreira.