Na estrada com Nereida: conheça a trajetória da instrutora de Auto Escola mais popular de Porto Ferreira

Com mais de 35 anos de experiência, Nereida Rocha fez parte da vida de muitos ferreirenses que tiraram carta em nossa cidade.

Na estrada com Nereida: conheça a trajetória da instrutora de Auto Escola mais popular de Porto Ferreira

Clarice Lispector certa vez escreveu "Mude! Mas comece devagar porque a direção é mais importante que a velocidade". A vida é cheia de testes e provas. Nem sempre sabemos a direção correta a seguir, quase nunca estamos no mesmo ritmo que outros. Cada um possui seus próprios obstáculos a superar, nesta longa estrada da vida.

Nereida Maria Rocha, nascida e criada em Porto Ferreira, superou muitas dessas barreiras até aqui. De origem simples, costumava acompanhar a mãe, Dona Ruth, que trabalhava como doméstica, nos dias de faxina. Ela se recorda que, desde muito cedo, sempre ajudou sua mãe nas limpezas. "Ela dava escovinha de dente para eu ir limpando o azulejo". Não foi fácil.

Sem nunca ter dirigido um carro na vida, Nereida conta que se tornou instrutora de auto escola com apenas 3 aulas. As aulas foram em uma Brasília. A oportunidade foi dada pelo senhor Eduardo Déscio, outra figura tradicional no ambiente automobilístico ferreirense. Seu primeiro emprego foi o que a consagrou, até hoje, como uma das mais populares e queridas instrutoras da cidade.

Ao longo de todos esses anos, muitas gerações de alunos passaram pelo volante guiado por Nereida. Ela conta que a relação com os alunos é uma via de mão dupla e que ao mesmo tempo em que ensina, aprende. "Até hoje, tem aluno de 18 anos me ensinando. Eu ensino, mas eu aprendo muito mais. Eles que vão me fortalecendo. Muito bom ensinar".

De sorriso aberto e presença marcante, o jeito de Nereida cativa até mesmo aqueles que estão apreensivos e inseguros, nas primeiras aulas ao pegar o volante. "Você tem que passar tranquilidade pra ele, eu tenho que tá tranquila do lado dele. Primeira aula minha já joga aqui no trânsito e a pessoa às vezes já assusta, mas depois do susto você vai embora".

Como toda relação, subidas e descidas fazem parte do trajeto, muita gente, é verdade, já passou por perrengues com o Padrão Nereida. "Tem vez que o aluno vai reclamar de mim para mãe e a mãe fala, que foi minha aluna também, fala: "você não sabe o que eu passei com ela!". Mas sempre ao final as coisas se acertam e a amizade e confiança é o que ficam. "Tem aluno que em uma hora ele conta a vida dele inteira, é um ato de muita confiança, você acaba se envolvendo com as histórias", conta ela.

Paixão maior do que o carro, só se for pelos cachorros das ruas de Porto Ferreira. "Eu desço, paro, mexo com os cachorros, faço meus alunos interagirem com eles. Os cachorros são fantásticos". É desta forma, que Nereida aos poucos foi conquistando o carinho e o respeito de muitos que por ela passaram. "O pessoal fala que eu sou a mais chata. Eu sou a melhor. Eu tento fazer o meu melhor".

Na infância, as alegrias se resumiam, como na grande maioria daqueles que viveram essa época, a brincadeiras na rua, na praça, nos trilhos da Fepasa, no rio. Com carinho, se recorda da figura de Dona Ruth Teixeira, durante alguns anos patroa de sua mãe. Nesta época, Nereida conta que a Dra. Teixeira pagava a ela para andar de charrete com os seus netinhos. Era diversão garantida.

Já na mocidade, em busca de diversão, conta que ajudava a enfeitar o Clube para ganhar o ingresso do baile e um lanche e, ainda, que se voluntariava a fritar batatinhas na quermesse para depois se divertir por meia hora no pula-pula.

A vida era simples e feliz. De muita luta e superação. Foi neste ambiente que a pequena Nereida cresceu. Seguindo os passos de sua mãe, Ruth Rocha. Incansável e fiel batalhadora, Dona Ruth com muito sacrifício criou e educou os filhos, ensinando os valores do respeito, da humildade e da idoneidade. "Minha mãe é minha vida, sempre trabalhou, sempre sofreu, sempre guerreira e sempre me dando força".

Nascida em Dois Córregos, Ruth se tornou ferreirense de coração, auxiliando muitas famílias. Voluntariamente acompanhava pessoas doentes no hospital Dona Balbina, apoiou a Rede de Combate ao Câncer, na cidade de Jaú e durante anos doava leite para amamentar crianças recém nascidas. "Uma vez eu fui na festa, aí uma mulher me disse, tá vendo aquela moça ali: você foi ama de leite dela".

Com 91 anos, lucidez e simpatia intactas, Dona Ruth tricota com perfeição a mais de 50 anos. "Aprendi sozinha, daí comprei um livro e fui fazendo". A arte da costura exige esforço e dedicação, a da maternidade, mais ainda. Quando perguntada sobre a sua relação com sua filha, emocionada ela conta: "A Nereida é tudo, é uma filha maravilhosa. Tem o coração de ouro. Ela é muito boa, não é só pra mim é boa para todo mundo".

A verdade é que a mulher forte e carismática que há 35 anos senta no banco de passageiro para ensinar gerações de ferreirenses a dirigir, nunca esteve sozinha. Sempre foi acompanhada de perto por sua copilota, Dona Ruth. Nos momentos difíceis, nas rotas confusas, nas estradas esburacadas, lá esteve e está Dona Ruth, passando a mesma tranquilidade para sua filha, que ela própria passa para seus alunos.

Para o futuro ela espera mais responsabilidade e educação dos motoristas e, assim, uma cidade melhor. "Eu perdi dois irmãos no trânsito, então você tem que passar um trânsito melhor, com mais respeito".

Repito - mais importante que a velocidade, a direção. E independente do ritmo em que as conquistas vieram para Nereida, elas vieram, porque a rota sempre esteve certa. O caminho sempre foi o do bem, o da dignidade, do caráter, da humildade e assim, ela segue transportando esta mensagem, através do seu sorriso espontâneo e do seu jeito descontraído de ser.

O projeto Porto de Memórias foi idealizado pelo ferreirense e jornalista Felipe Lamellas e se propõe a contar histórias de vida de personalidades marcantes para a cidade, conhecidas ou não. O objetivo principal é resgatar e preservar a memória da comunidade local, contando histórias, causos e lembranças de membros da sociedade, que se confundem com a própria história da cidade.