Seleção natural, seleção social e eugenia

Seleção natural, seleção social e eugenia

Darwin, em a Origem das Espécies, que, na verdade, não fala de origem uma vez que está preocupado com as transformações anatômicas e fisiológicas dos animais e plantas, inicia o livro tratando, nos quatro capítulos iniciais das seleções feitas pelos homens desde nossos ancestrais até as do século XIX. Pombos, ovelhas, outros animais e muitas plantas foram selecionadas, através dos tempos, por pastores e agricultores para melhorar a espécie. Darwin chamou-a de seleção artificial, a seleção feita pelo homem. Conquista o leitor com as histórias desta seleção que fez a civilização aumentar a produção de alimentos.

Depois, no quinto capítulo, Darwin dá o pulo do gato e explica a seleção natural, a seleção feita sem a intervenção do homem, a seleção feita pelas próprias espécies graças às pressões ambientais. Um grupo de tartarugas que se vê sem água durante um bom período, migra para outro lugar ou muda sua dinâmica fisiológica. Nossos organismos conseguem mudar para sobreviver. Temos plasticidade suficiente para reorganização do corpo.

Já a seleção social é a seleção feita pelos homens a outros homens. Quando Darwin esteve no Brasil, ficou em uma fazenda de um português em Niterói. Era abril de 1932. Saindo um dia para andar pela fazenda, um escravo deixou cair o arreio de seu cavalo. O escravo se agachou e levantou a mão esperando uma chicotada. Chocado, Darwin escreveu em seu Diário que o homem também era domesticado assim como as plantas e animais.

Voltando para a cruel realidade da Covid-19 no Brasil temos a seleção natural do Sars-2 que reage às pressões ambientais e cria variantes, temos a seleção social e a eugenia. As duas últimas ligadas ao desmanche da humanidade.

Costumo dizer que antes da Covid-19 tivemos a primeira pandemia social com Temer. Rapidamente, esse presidente de empresários liquidou os serviços públicos, vendeu a previdência social, doou a educação pública e elegeu o sucessor e seu ministro da economia que, já no Chile, liquidou os aposentados deste país. Essa é a seleção social. Temer fez a seleção social quando extinguiu a carteira assinada substituindo-a por trabalho horista como era antes de 1945. Fez seleção social quando uma PEC roubou por 20 anos os recursos para saúde e educação.

O curioso desta seleção é que a introjetamos em nossa alma brasileira. É preciso fazer economia, todos falam. Mas, ninguém pergunta para quem? Interiorizamos a pobreza, a morte e as dificuldades de sobrevivência.

Nessa toada, quando a Covid-19 emerge dos desmatamentos e mudanças climáticas, o Brasil já está pronto para a EUGENIA. A frase "é só uma gripezinha" foi aceita e, pasmem, divulgada por médicos. Tornamo-nos um povo sinistro que outros países não querem. Somos transmissores de covid-19.

Ontem, terça-feira (escrevo este texto na quarta-feira, dia 10/3) pude ver jornalistas de mídias oficiais preocupados em quem vai ser candidato a presidente em 2022, dada a anulação dos processos contra o presidente Lula. Uma das mídias mais ricas do país passou quase 12 horas levando advogados e juristas para tirar deles uma suspeição contra o ministro do STF. O senhor Mercado, diziam os jornalistas, está raivoso. O dólar subiu.

Bem, o senhor Mercado, cujo sobrenome é o dos banqueiros, está também preocupado com a interrupção do plano Guedes para os trabalhadores. Os jornalistas e seu patrão também. O dólar não sobe quando a curva de mortes de brasileiros vai aos céus. A bolsa de valores não dá valor aos corpos enterrados. Nossa vida não vale nada. Isso é EUGENIA cuspida e escarrada na nossa cara.

Ontem, vi um dia e parte da noite como vi o dia da prisão de Lula. De um lado, o presidente no sindicato dos metalúrgicos, abraçado por uma multidão e do outro lado, o chamado "empresário da noite", em seu Bahamas Hotel Club oferecendo cerveja de graça a trabalhadores e trabalhadoras do sexo celebrando a prisão.

Um puteiro e um sindicato. A opção foi pelo primeiro.

Nada contra o trabalho das prostitutas, mas contra qualquer tipo de escravidão e roubo do trabalho alheio.

Marta Bellini
*Professora aposentada da Universidade Estadual de Maringá. Com doutorado em Psicologia, mestrado em educação e graduação em Biologia, diletante em Literatura, uma ornitorrinco, tem a sorte de continuar a ser integrante do Grupo de pesquisa Science Studies CNPq-UEM, na mesma universidade, grupo interdisciplinar de pessoas da filosofia, pedagogia, biologia, física, psicologia entre outras áreas. Sindicalistas nos períodos necessários, teve a honra de participar com colegas de duas grandes greves, a de setembro de 2001 a março de 2002, e a de abril-maio de 2015, as duas contra privatização das universidades públicas do Paraná e a última, também contra a reforma da previdência, além, é claro, de lutar da dignidade salarial.