A HISTÓRIA DA DITADURA EM PORTO FERREIRA - III PARTE


Em artigos anteriores foram abordados um resumo do Golpe de 64, as manifestações públicas, o apoio da imprensa e da população ao ato – a crença de que os militares restaurariam a democracia, o combate ao "comunismo", a Campanha do "Ouro para o Bem do Brasil" e a citação de pessoas que foram perseguidas naquele fatídico 1964 em Porto Ferreira.

Este artigo, iniciará a exploração dos arquivos destas pessoas coletados pelo DOPS.

O DEOPS/SP

O DEOPS (Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo), localizado nas proximidades da Estação da Luz em São Paulo, foi obra do arquiteto Ramos de Azevedo. Construído em 1914 para ser o armazém da Estradas de Ferro Sorocabana, a partir de 1942, tornou-se a sede do Dops. Nele, Caetano Veloso, Gilberto Gil e outros foram interrogados e muitos presos torturados nas seis celas, verdadeiros, cubículos do prédio. O imóvel foi tombado em 2002 pelo CONDEPHAAT e, atualmente, abriga o "Memorial da Resistência", aberto à visitação pública, onde é possível sentir na pele o drama de quem passou por aquele local.

O DOPS/SP foi o órgão utilizado pela Ditadura, principalmente, com a função de verificar a entrada, movimentação e saída de imigrantes no país e catalogar informações de sindicatos indivíduos acusados de ferirem a ordem pública. Na realidade, o DOPS subsidiou uma verdadeira cassa aos indivíduos com atitudes "subversivas", chamados de comunistas. O Arquivo Público do Estado de São Paulo abriga o acervo do Dops e o disponibiliza gratuitamente na internet. Este acervo serve de base para a elaboração destes artigos.

A Ditadura em Porto Ferreira

O Jornal "O Ferreirense", de 21 de junho de 1964, estampou na capa o retorno do Prefeito Municipal Oswaldo da Cunha Leme ao poder executivo. Segundo a reportagem, o Dr. Juiz da Comarca de Porto Ferreira anulou a decisão de cassar o Prefeito Municipal por terem interpretado de maneira confusa o Ato Institucional nº1, instituído pelo Governo Ditatorial. Segundo os arquivos do DOPS, Oswaldo da Cunha Leme teve seu mandato cassado "teve seu mandato de vereador cassado no desenrolar de investigações emanadas do Ato Institucional, conforme ofício da Câmara Municipal de 5 de junho de 1964. Segundo argumentação da câmara, havia provas de que o Prefeito Municipal mantinha relações com elementos comunistas e estava fichado no DOPS como seguidor dos ideais bolchevistas.

Entretanto, outros cidadãos não tiveram a mesma sorte. Em 12 de abril de 1964, o Jornal "O Ferreirense" trouxe a reportagem com o título: "DOIS VEREADORES PERDERAM O MANDATO". Segundo o artigo, "a reunião ganhou desusada movimentação pela inclusão na ordem do dia, dos projetos de resolução n.ºs 5 e 6/64, de autoria de Waldemar Menin, propondo a cassação dos mandatos do vereador Dr. Raimundo N. A de Alencar e do suplente Benedito Bitencourt de Andrade". Baseado no Ato Institucional, não mereceram, sequer, oportunidade de defesa ou contestação da ala situacionista, cuja bancada pertenciam os dois edis, sendo o projeto aprovado por unanimidade.

RAIMUNDO NEVES AYRES DE ALENCAR

Baseado em informações do arquivo do DOPS, Raimundo Neves Ayres de Alencar foi advogado, militante, vereador com mandato cassado como medida de segurança nacional pela Câmara Municipal de Porto Ferreira e sindicado pela Delegacia de Polícia de Porto Ferreira, pois conta que o mesmo tomou rumo ignorado após o movimento revolucionário de 31 de março de 64. Nunca realizou propaganda comunista, porém, foi processado em 1949, no Rio de Janeiro, por atividades vinculadas à UNE (União Nacional dos Estudantes). Apurou-se que se tratava de elemento de filiação comunista.

BENEDITO BITTENCOURT DE ANDRADE (SUMARÉ)

Nos arquivos do Dops consta que era guarda-trem da Cia. Paulista e elemento comunista fervoroso, candidato à Diretoria do Sindicato dos Trabalhadores em Empresa Ferroviária da Zona Paulista. Trata-se de um antigo militante do Partido Comunista do Brasil. "Segundo relatório da autoridade policial da cidade em apreço, Benedito queimou o material de propaganda comunista existente em sua residência, um dia antes da diligência policial levada a efeito na mesma. Entretanto, foram apreendidos na lata de lixo, parcialmente queimados, 3 pedaços de papéis que comprometeram o fichado". Consta que é autor de "pixamento" de paredes com dizeres subversivos em Porto Ferreira. Na ficha de Andrade consta que traçou os planos a serem seguidos pelos grevistas da Cerâmica Porto Ferreira S/A e que foi afastado da Cia. Paulista de Estradas de Ferro em virtude de sindicância que apurou atividades subversivas. Em declarações prestadas à Delegacia de Polícia de Porto Ferreira foi apurado tratar-se de comunista atuante, agitador inveterado, tomando parte ativa em greves de classes trabalhadoras estranhas a sua. Consta em certidão da Câmara Municipal, que na qualidade de vereador, em 26/11/64, protestou contra o governo revolucionário.

(Continua na próxima edição)