O Porto de João Ferreira
A origem, crescimento e legado da capital do vale do mogi.
João Inácio Ferreira, o balseiro responsável pela travessia sobre o rio Mogi Guaçu, tornou-se uma figura central na história local. Por meio de seu nome, o local que pertencia a Descalvado ficou conhecido regionalmente. Esta história é conhecida pelos ferreirenses e foi eternizada pelas brilhantes palavras do professor Flávio da Silva Oliveira, que empreendeu uma busca pelos documentos que comprovassem nossas características gerais.
A Dominância Indígena na Região
Durante a colonização, o território onde Porto Ferreira se encontra era fortemente dominado por povos indígenas, em particular os tupiniquins. A carta cartográfica do Brasil de 1740 (Imagem 1) mostra a vasta área ocupada por esses índios, referidos como "Tuppinikinsi". Essa presença indígena deixou marcas profundas na cultura e na história da região, influenciando os primeiros colonos e moldando o desenvolvimento inicial do local.
Legenda Imagem 1: Carta cartográfica do Brasil em 1740 mostrando a dominância indígena na região.
O Início da Balsa
Antes de João Ignacio Ferreira assumir a balsa, ela foi iniciada por seu sogro, Joaquim Alves Dias. João Inácio Ferreira, natural de Minas Gerais, onde nasceu em 1815, casou-se duas vezes. A primeira com a viúva Joaquina Maria da Conceição, com quem teve seu primogênito Thomé Ignacio Ferreira, e a segunda com Maria Joanna Rosa, com quem teve mais um filho, João Inácio Ferreira Filho, nascido após sua morte.
João Inácio Ferreira transportava tropas, cargas e viajantes de um lado para o outro do rio Mogi Guaçu. Por volta de 1861, Joaquim Procópio de Araújo Carvalho comprou uma grande área de terra e proibiu o tráfego público por ela, forçando João Inácio Ferreira a mudar a balsa rio abaixo. No novo local, ele construiu um casebre de pau-a-pique e um potreiro. O povoado começou a ser conhecido como Porto das Barcas, Porto de São Vicente Ferreira, e, posteriormente, Porto de João Ferreira, simplificado para Porto Ferreira.
O Desenvolvimento da Vila
Com a construção da ponte sobre o Rio Mogi, a balsa de João Ferreira perdeu a utilidade. O vilarejo ao redor do rio continuou sendo chamado de "Porto de João Ferreira" em várias cartas do Brasil Imperial, incluindo na passagem de Dom Pedro II em 1886. Com a vinda da Cia Paulista com a linha férrea e a construção de um porto de navegação fluvial, a vila começou a crescer e tomar estrutura de cidade, tendo seu início no que hoje chamamos de "Avenida Nicolau de Vergueiro Forjaz", que já teve diversas alterações de nomes ao longo da história.
O Legado de João Ignácio Ferreira
Legenda Imagem 2: Foto de João Ignácio Ferreira Filho, foto original do Museu Municipal, restaurada por Christopher Adrian.
O legado de João Inácio Ferreira é vasto e complexo. Como cita o livro "Aspectos Históricos de Porto Ferreira" de Miguel Bragioni e Renan Arnoni, João Ignácio Ferreira faleceu em seis de julho de 1877, com sessenta e dois anos de idade, deixando sua segunda esposa, Maria Joanna Rosa, grávida de seis meses.
Em minha pesquisa, descobri que João Inácio Ferreira Filho, nascido em 7 de fevereiro de 1878 e batizado em 21 de fevereiro de 1878 em Pirassununga, teve uma vida que refletiu a importância de sua família na região. Os pais são João Ignácio Ferreira e Maria Joanna Rosa. Os padrinhos são Joaquim Alves Dias e Conceição. João Inácio Ferreira Filho faleceu em Porto Ferreira em 1915, com 37 anos. Seu túmulo foi localizado e fotografado no Cemitério da Saudade em Porto Ferreira (Imagem 3).
Legenda Imagem 3: Túmulo de João Inácio Ferreira Filho no Cemitério da Saudade em Porto Ferreira, foto por Christopher Adrian.
Já o túmulo do balseiro João Ignácio Ferreira, falecido em 6 de julho de 1877, sempre foi um mistério. Em minha pesquisa, cruzei informações da data de óbito com a história de Pirassununga e descobri que a cidade possuía diversos cemitérios durante sua existência. No período de falecimento de João Ignácio Ferreira, Pirassununga estava utilizando o Segundo Cemitério da cidade devido à superlotação do primeiro. O Primeiro Cemitério era ao lado da Primeira Igreja de Pirassununga, hoje chamada de Igreja Nossa Senhora Assumpção, ao lado da Rodoviária (Imagem 4).
Legenda Imagem 4: Local da Primeira Igreja de Pirassununga, onde estava localizado o Primeiro Cemitério. Foto por Christopher Adrian.
Mapa de Pirassununga elaborado pelo historiador Manuel Pereira de Godoy mostra a localização do primeiro e do segundo cemitério (Imagem 5).
Legenda Imagem 5: Mapa de Pirassununga de 1868 mostrando a localização dos cemitérios.
Ambos os cemitérios foram destruídos e hoje há construções sobre esses locais (Imagem 6).
Legenda Imagem 6: Local onde ficava o Segundo Cemitério de Pirassununga, agora com construções sobre ele. Foto por Christopher Adrian.
Thomé Ignácio Ferreira e os Custos do Falecimento
Thomé Ignácio Ferreira, filho de João Ignácio Ferreira com Joaquina Maria da Conceição, teve um papel crucial no processo de inventário e na preservação do legado de seu pai. Em 27 de agosto de 1878, Thomé pediu para ser juntado aos autos várias dívidas feitas por ele em auxílio ao seu finado pai, João Ignácio Ferreira, que somaram Rs131$768. Esses valores incluíam custos com medicamentos, itens de uso pessoal e atendimentos médicos concedidos a seu pai no leito de morte. Segundo recibo de 7 de junho de 1877, foram gastos oito mil seiscentos e quarenta réis em remédios fornecidos ao falecido.
Na página 26 do Inventário, encontra-se uma receita fornecida a João Ignácio Ferreira, "morador no porto": "Assafetida - 4 gramas; Acido Phenico - 5 gotas; Essência de hortelã pimenta - 5 gotas; Gemma D"ovo; Água quente 200 gramas". A indicação destes medicamentos, que perfizeram a soma de mil e quinhentos réis, foi "para uso externo como clyster".
Dentro das despesas apresentadas por Thomé Ignácio Ferreira, em 13 de julho de 1877, pelas horas de sino e o risco da cova, foram cobrados 4$640 pelo sacristão da Vila de Pirassununga, Joaquim Miranda de Jezus. Dos gastos com o enterro, efetuados no dia 7 de julho de 1877, constam: 1 caixão - 10$000; 3 missas de corpo presente - 12$000; Suportes de velas para enterro - 6$500; Recomendação da alma - 2$400; Despesas noturnas - 7$600. O total perfaz 38$500 (trinta e oito mil e quinhentos réis).
As compras realizadas por Thomé na "A Loja do Carneiro", em 6 de julho de 1877, pertencente ao Sr. Antonio José do Amaral Rocha, incluíram: 1 paletó de pano preto 13$000; 1 calça de brim trançado 6$000; 2 pares de chinelos de trança 4$000; 4 lenços pretos de chita 1$280; 36,30 metros de chita preta 21$780; 28,80 metros de chita estreita 10$368; 2 lenços pretos $640; 4 metros de 5$200; 2,5 metros de algodão $800; 10 metros galão largo 4$000; 9 metros de cadarço $720; 1 caixa de taixas $320; 150 taixas amarelas $480; 5 metros de baita escarlate 10$000. Total: 78$588.
As Netas de João Ignácio Ferreira
Thomé Ignácio Ferreira se casou com Bernardina Maria Luz, com quem teve três filhas: Maria Ferreira, nascida em 8 de janeiro de 1875 e batizada em 11 de janeiro de 1875; Rita Ferreira, irmã gêmea de Maria, nascida em 8 de janeiro de 1875 e batizada também em 11 de janeiro de 1875; e Eliza Ferreira, nascida em 21 de maio de 1881 e batizada em 1 de junho de 1881. Essas netas de João Ignácio Ferreira continuaram a linhagem da família, mantendo viva a memória do balseiro que deu nome à cidade.
Conclusão
A história de Porto Ferreira é profundamente entrelaçada com a vida e o legado de João Inácio Ferreira. Desde suas origens como um ponto de travessia no rio Mogi Guaçu até seu desenvolvimento como uma vila e posteriormente uma cidade, a influência de João Inácio Ferreira e sua família é inegável. Sua contribuição para a história local é celebrada e lembrada, não apenas nos documentos e registros, mas também nos corações e mentes dos ferreirenses.
Legenda Imagem 7: Mapa da Província de São Paulo em 1879, com Porto de João Ferreira.
Fontes:
? Livro "Aspectos Históricos de Porto Ferreira" Vol.2 de Miguel Bragioni e Renan Arnoni
? Site da Prefeitura de Porto Ferreira
? Arquivos e registros do Museu Histórico e Pedagógico de Porto Ferreira
? Mapa da Província de São Paulo em 1879
? Carta cartográfica do Brasil em 1740
? Fotografias e pesquisas realizadas por Christopher Adrian