A esperança através da voz: conheça a trajetória de Yara Montanheiro, primeira Fono a atuar na cidade

Há décadas levando esperança a pacientes e seus familiares, a fonoaudióloga Yara Montanheiro, entrevistada pelo Porto de Memórias, compartilha sua trajetória de vida e memórias

Foto: Giovana Seriane/Porto de Memórias

Foto: Giovana Seriane/Porto de Memórias

A voz é a mais íntima expressão do ser. Como instrumento biológico, ajudou a humanidade a se desenvolver e se diferenciar de todas as espécies do planeta; através dela o mundo conheceu as belezas da música e da arte, não à toa, a voz é também, especialmente na esfera social, o principal sinônimo de liberdade.

Já dizia Abelardo Barbosa, o histórico Chacrinha, "quem não se comunica, se trumbica!". A premissa é cada vez mais válida no mundo globalizado que vivemos. Tudo é comunicação. E é a isso, a missão de proporcionar a socialização, a emancipação e a autonomia com qualidade de vida, que a fonoaudióloga Yara Antonio Montanheiro se dedica a mais de 40 anos.

Filha de José Olímpio Antônio (Tenente Olímpio) e Elza Antônio (Dona Zá), Yara passou os primeiros anos de infância na cidade de Campinas, onde nasceu em 12 de fevereiro de 1960. Na cidade, estudou em colégios católicos, de freiras.

Meu pai sempre primou pela nossa educação, mesmo com muito sacrifício ele nos colocou em boa escolas.

Para ela, seu pai sempre foi um visionário, culto escrevia e apreciava uma boa leitura; "O mundo pertence as mulheres", dizia ele de forma revolucionária. Sua mãe, Dona Zá, por sua vez, era expoente de candura e mansidão, com grandes dotes artísticos. "Minha mãe era uma artista maravilhosa, pintora de telas, porcelana".

A habilidade artística foi herdada por Yara e aplicada por ela em sua profissão, com os seus famosos e pedagógicos desenhos sobre a anatomia da língua, por exemplo. Além do dom artístico, Yara conta que sua mãe foi grande apoiadora de causas sociais, como a Rede de Combate ao Câncer. "Eu herdei isso dela, gosto muito de ajudar as pessoas".

Com a aposentadoria de seu pai, a família se mudou para Porto Ferreira em 1971. Yara caracteriza sua relação com a cidade como um namoro e, posteriormente, um casamento. Mas uma coisa é certa: não foi amor à primeira vista. Acostumados com a beleza campineira, Yara se recorda que não queria se mudar de Campinas. "Viemos chorando a mudança toda". Foi um início conturbado.

Ao chegarem na pequena cidade, Yara se recorda que pediu ao seu pai para comprar refrigerante. E esse não encontrou nenhum bar ou qualquer coisa do gênero aberto. A conclusão aos prantos foi: "Viemos parar numa cidade que não tem nem refrigerante!". A verdade, descoberta apenas algum tempo depois, era que a família se mudou para Porto justamente no feriado de 29 de julho.

De forma muito clara ela se recorda como aos poucos, a cidade foi ganhando espaço no coração da família campineira. Conta as memórias no Jardim Central, ainda em formato de bandeira, o popular Footing, as paqueras, o auto falante, a Avenida 24 de Outubro, onde morou e brincou de esconde-esconde na Antiga Companhia Prada de Eletricidade. "Todo mundo se conhecia. Aqui nós formamos os nossos amigos, que moram no nosso coração".

Eu acho que isso é muito bacana numa cidade interiorana, a gente pode viver mais intensamente esses momentos de alegria, da juventude, da meninice.

Aluna do Washington Luís, Yara se recorda com carinho de diversos professores que fizeram parte de sua trajetória escolar, como a Dona Dalva de Ciências, a Nelza Palhari, a Munira de Português, do Getúlio de Matemática, da Maria Vilma de História e tantos outros. "Eu acho que eu fui de uma geração muito privilegiada por ter tido esses professores". Além dos mestres, como esquecer, questiona ela, a Cantina do Alfredinho e os "pisius" da inspetora Cida Peliçari, que comandava os alunos.

Cursou Fonoaudiologia na PUC, evento que marcou o retorno a Campinas. Entretanto, os vínculos com a cidade já tinham se estreitado.

Porto Ferreira passou a ser o meu lugar, o nosso lugar. Era aqui que eu ficava feliz, era aqui que eu queria estar.

Formou-se em 1981 e de volta a cidade tornou-se a primeira Fonoaudióloga a atuar no município de Porto Ferreira, atendendo, inclusive, pessoas de toda a região. "Desde aquela época Fono já era uma peça rara, hoje em dia mais ainda".

Seu primeiro emprego, foi sua casa por mais de 20 anos: a APAE. Lá ela aprendeu o dia a dia da Fonoaudiologia. "Entidade maravilhosa, que tem muitas dificuldades, mas é onde o profissional aprende. Apae mora no meu coração. É a minha casa".

Destaca o apoio, no início de sua jornada profissional, da Psicóloga Vera Teixeira.

Sou muito feliz por ter construído uma parceria com tantas pessoas aqui na cidade, médicos, dentistas, a Fonoaudiologia permite isso: nós vemos o ser humano integralmente.

Yara destaca também a importância na profissão em ajudar idosos, adultos e crianças a superarem as suas dificuldades de comunicação e tantas outras, melhorando assim a qualidade de vida.

Tem crianças que ficaram comigo por muito tempo. A gente acaba criando um companheirismo com os familiares, que eu respeito muito. Muitos me chamam de tia até hoje na rua.

Em 1982, a trajetória de Yara ganhou um novo capítulo. Neste ano, iniciou o namoro com o ferreirense Paulo Montanheiro, com quem se casou em 1986. Da união, nasceram as três filhas do casal.

Eu fui bem acolhida pela cidade. Aqui é o meu lugar. Que ela continu dando oportunidades para as pessoas. Que elas tenham aqui um "porto seguro". Que a cidade não perca esse ar interiorano que ela quer. Eu sou muito grata por tudo que Porto Ferreira me ofereceu, é a ela que eu devo tudo que eu tenho tudo que eu sou.

O projeto Porto de Memórias foi idealizado pelo ferreirense e jornalista Felipe Lamellas e se propõe a contar histórias de vida de personalidades marcantes para a cidade, conhecidas ou não. O objetivo principal é resgatar e preservar a memória da comunidade local, contando histórias, causos e lembranças de membros da sociedade, que se confundem com a própria história da cidade.