Com a tocha toda: conheça as memórias de Tio Zé dos Santos, o ferreirense que carregou a chama Olímpica em 2016

Na semana em que os Jogos de Tóquio se iniciam conhecemos a trajetória do carteiro aposentado que carregou o fogo mais importante para o esporte mundial

Com a tocha toda: conheça as memórias de Tio Zé dos Santos, o ferreirense que carregou a chama Olímpica em 2016

Em 2016, pela primeira vez na história, o Brasil sediou no Rio de Janeiro os Jogos Olímpicos e Paralímpicos. O ferreirense José dos Santos Filho foi o escolhido para representar a região e carregar a simbólica tocha Olímpica. A chama, transladada por alguns minutos pelo Tio Zé, como é popularmente conhecido, foi acesa em uma cerimônia nas ruínas de Olímpia, na Grécia, percorreu todos os estados do país até incendiar a Pira Olímpica no Maracanã na noite de 5 de agosto, na abertura oficial dos Jogos.

O papel de ser a atenção do planeta por um fração de tempo, pesou leve nas mãos de Tio Zé, acostumado com a responsabilidade de transportar coisas valiosas. Carteiro aposentado, Tio Zé dos Santos trabalhou por mais de 30 anos nos Correios, uma das mais importantes e antigas empresas do país. Em todo este tempo de serviço, Tio Zé entregou muito mais do que contas e produtos, transportou sonho e felicidade também.

Quantos jovens não esperaram ansiosos por cartinhas e correspondências trazidas pelo cupido Zé dos Santos? Talvez nunca saibamos, mas uma coisa é certa: carteiro vê e ouve de tudo! Nesta vasta trajetória, o filho de José dos Santos e Eudócia Pereira coleciona causos e histórias que ele próprio testemunhou ou que apenas "ouviu dizer" por aí. Tanta riqueza foi compartilhada nas diversas produções literárias de Tio Zé, que ganhou, merecidamente, o título de "Carteiro poeta de Porto Ferreira".

O menino que futuramente viria a ser escritor, nasceu, cresceu e trabalhou na roça, estudando em escola rural apenas até o 4º ano. Aos 17 anos se mudou com a família para Porto Ferreira, em busca de uma vida melhor. Por volta dos 30 anos conseguiu voltar a estudar, por meio do Projeto Minerva, atualmente o Ensino de Jovens e Adultos. As aulas, na época, aconteciam pelo rádio.

A sede pelo aprendizado, fez com que Tio Zé, já servidor dos Correios, continuasse sua capacitação por meio dos cursos profissionais a correspondência, ofertados pela Empresa de Telégrafos. Ele conta que, como toda a lenda, o seu despertar artístico ocorreu de forma bastante inusitada. Em certa altura da vida, já morando com a sua esposa no Jardim Aníbal, ao lado da Vila Sibila, um sapo, uma poça e algumas crianças foram os responsáveis pelo início da carreira como poeta do ferreirense.

Tio Zé conta que um belo dia, quando pela manhã saiu para regar a horta, nos fundos de sua propriedade, percebeu a presença de um sapo entre as hortaliças. Ao se aproximar trazendo consigo uma pá, no intuito de remover o anfíbio, o poeta relata que escorregou em uma poça de água deixada pela chuva da noite anterior, foi ao chão e com isso arremessou o sapo para as alturas! A cena inusitada levou ao delírio algumas crianças que brincavam nas proximidades. Tio Zé relembra que ali, sentado na poça, ao ver a alegria da molecada não teve coragem de explicar o voo do animal de quatro patas e apenas guardou os fatos para a produção de seu primeiro conto: "O dia que o sapo voou!".

Com este pequeno texto, Tio Zé se inscreveu no Mapa Cultural Paulista com o apoio do saudoso Marco Riolino e foi premiado em um teatro na capital paulista. A partir daí não parou mais, escreveu centenas de causos e participou de inúmeros festivais, representando Porto Ferreira em várias cidades da região. "Peguei carona no voo do sapo".

Aos mesmas mãos que durante anos foram encarregadas de entregar correspondências pelos Correios ou que tão bem registram por meio papel e caneta os causos e histórias do dia-a-dia, também fazem sucesso na cozinha. "Hoje eu posso dizer com orgulho, não de soberba, mas de satisfação, eu já completei 88 participações de programas na TV apresentando minha culinária, e até hoje todas deram certo, não errei nenhuma".

O versátil e habilidoso carteiro, poeta e cozinheiro Zé dos Santos destaca a fraternidade da cidade em acolher, como ele já foi acolhido um dia. "Porto Ferreira pra mim é aquela cidade franca e hospitaleira que recebe a todos com um carinho de mãe, onde sempre cabe mais um". E deseja para o município um desenvolvimento em que todos façam um pouco, "pra virar muito", finalizando com uma mensagem que muito define a personalidade do conterrâneo que entrou para a história ao carregar a Tocha Olímpica: "Instrua te como se a vida fosse eterna, e viva como se a morte fosse amanhã".