A decomposição ética, da alma e dos corpos

Coluna publicada no JORNAL DO PORTO dia 7-5-2021

A decomposição ética, da alma e dos corpos

Escrevo esta coluna na terça-feira ouvindo a abertura da CPI da Covid-19, ou melhor, da CPI pela não amparo da população brasileira nessa crise sanitária. De longe vejo velhos senadores misturados aos mais novos formando barreira à investigação. Os argumentos são de bebês recém-nascidos, gugu dadá e muito blá blá para empatar o trabalho. Veremos, mais tarde, a gravação do berçário. Adultos contra a CPI num fraldário.

Não mais distante, em Brasília, estão os ministros das maiores frases putrefatas. O ministro da economia sobre Paulo Freire: "Ensinava sexo para crianças de 5 anos". Maconha, bebida, droga, dentro das universidades. Estado caótico. Eu prevejo o mesmo fenômeno para a saúde".

Não envergonhado, disse que até filho de porteiro foi para a universidade. Certamente, o ministro discursa contra a população, ele, justo ele, o homem que leu oito (oito!) livros para administrar a economia ultraliberal do país.

Não esqueçamos que essa política dos oito livros estava sendo iniciada por Temer, em abril de 2017, quando "perdoou" uma dívida de sonegação do Itaú de 25 milhões. Ontem, segunda-feira, dia 3 de maio de 2021, os jornais publicaram a opinião da herdeira do Itaú dizendo que a solução para a miséria no Brasil é a CARIDADE PRIVADA. Hoje, dia 4 de maio, a reportagem é sobre o seu banco. LUCRO DO ITAÚ SOBRE 64% NO 1O TRIMESTRE DE 2021 E ATINGE 6,4 BILHÕES.

Ainda quer, o prestimoso banco a caridade privada com as mãos e os oito livros do ministro da economia, aumentar seus lucros. Ela está dizendo que caberia bem a privatização do SUS, a única instituição que mantém a luta contra a Covid-19 junto com as únicas instituições públicas Butantã e FioCruz. Caridade privada, nova decomposição das elites para continuar o genocídio atual. Grossa metáfora da fina elite.

De Brasília oficial, as frases desceram às ruas. No dia 1 de maio, o movimento das direitas no Dia dos Trabalhadores em diversas cidades acompanhou imbróglio linguístico. Uma delas: "Porquê (como estava no papel) não mataram todos em 1964? ", com duas senhoras aparentemente normais.

Em Maringá, onde moro, chamou-me a atenção na manifestação da direita, um senhor com triciclo motorizado, amarelo, com capacete fantasiado, com barriguinha e as perninhas finas, pronto para a fotografia do Manual do Patrão.

As imagens de uma mulher de biquíni, amarelo e verde, com as nádegas pintadas deixou alguns homens inquietos. Eu não gostei das cores, nem do cartaz desenhado no corpo, "destituir o STF".

Enquanto isso, o ministro dos oito livros, está hoje na CCJ, para naturalizar os escombros do país. Vai discorrer sobre a importância da reforma administrativa. A reforma não é aplicada aos militares de alta patente, juízes, procuradores, gente do universo dos salários mais altos e aplica a lei do Talião ao zelador, porteiro, enfermeiras, professores, coletor de lixo técnicos em geral. Isso em plena pandemia. Escombros para nós. Decomposição do país.


P. S.

Neste Maio de 2021 comemoramos o centenário de Paulo Freire. Não nasceu educador, tornou-se um, um dos maiores do mundo. Formou-se em Direito e, advogado, seu primeiro trabalho foi cobrar os móveis de um dentista recém-formado. O dentista havia comprado móveis para seu casamento e não conseguia pagar as prestações. Então, Paulo Freire conversou com ele. Disse: - Vou voltar para casa e falar com minha mulher. Vou pedir demissão. Enquanto isso, você terá alguns dias para negociar até que a loja encontre outro advogado.

Senhor Ministro da economia, num país civilizado, o senhor seria preso.

*MARTA BELLINI

*Professora aposentada da Universidade Estadual de Maringá. Com doutorado em Psicologia, mestrado em educação e graduação em Biologia, diletante em Literatura, uma ornitorrinco, tem a sorte de continuar a ser integrante do Grupo de pesquisa Science Studies CNPq-UEM, na mesma universidade, grupo interdisciplinar de pessoas da filosofia, pedagogia, biologia, física, psicologia entre outras áreas. Sindicalistas nos períodos necessários, teve a honra de participar com colegas de duas grandes greves, a de setembro de 2001 a março de 2002, e a de abril-maio de 2015, as duas contra privatização das universidades públicas do Paraná e a última, também contra a reforma da previdência, além, é claro, de lutar da dignidade salarial.