O vírus do ministro da economia

Coluna publicada no JORNAL DO PORTO dia 30-4-2021

O vírus do ministro da economia

Caiu o ministro das relações exteriores, entrou o ministro da economia na rede das más piadas. Em reunião no Ministério da Saúde, na terça-feira, dia 26/4, o economista que engoliu as aposentadorias na ditadura do Chile, acusou a China por fazer o Sars-2-19, da Covid-19. Na turba privatista, disse que o SUS não é a solução e precisamos privatizar a saúde. Tem banqueiro esfregando as mãos de alegria.

Avisado que estava sendo gravado, pediu desculpas. Era tarde. Adolescente nascido em 1949, provocou o país que tem enviado as vacinas ao Butantã sabendo que estamos pisando em cadáveres no Brasil. Em outro país, estaria preso.

Não é para esperar demais do ministro que, em reunião, em 2020, com os demais ministros, se gabou de ler oito livros para fazer a agenda de alto risco capitalista no atual governo. A bem da verdade, nem precisaria ter lido esse grupinho de livros, sua agenda veio escrita pelos banqueiros; era só aplicar. A Margareth Thatcher dos trópicos veio para cortar o leite das crianças das periferias, para privatizar o restante do patrimônio público que FHC não teve tempo de fechar, em 1998.

Vou me centrar apenas na ideia de que o vírus foi feito na China, como proclama o ministro brasileiro.

Das pandemias mais duras tivemos, a do século 14, a peste bubônica ou a peste negra, na Europa. Vinda da Ásia por meio dos viajantes e comerciantes, a peste bubônica, transmitida por ratos e pulgas, e desenvolvida pelo bacilo Ersinia pestis, essa doença ampliou-se quando florestas foram destruídas nos entornos das cidades. Matou um terço da população atingida.

A colonização das Américas no final do século 15, também matou muitas populações. As guerras contra os povos originários levaram à destruição de florestas, animais e os próprios povos pela varíola, sarampo, tifo, difteria, malária, gripes, cólera entre outras.

A gripe espanhola, pandemia entre 1918 a 1919, deixou 50 milhões de mortos no mundo todo. A gripe ocorreu no período da Primeira Guerra Mundial e também está relacionada a um momento histórico de devastação de matas e florestas no planeta sobretudo devido à guerra. Parece que a origem do vírus está em Kansas, EUA, onde tivemos os primeiros casos. A China foi pouco influenciada por esta gripe. No Brasil, a gripe chegou em 1918 e rapidamente se espalhou pelo país matando 35 mil pessoas.

Nos EUA, a aspirina atuou como a cloroquina e matou muitas pessoas por intoxicação nos casos da gripe espanhola.

Na Primeira Guerra Mundial, como escreveu José Luztemberg, em 2001, gás venenoso foi usado como arma tóxica. Em jogo estava a Bayer desenvolvendo ésteres do ácido fosfórico que, na Segunda Guerra, foi transformado em inseticida, o DDT, que destruiu uma parte de lagos e florestas do Japão.

Usado contra a malária no Pacífico tornou-se um potente biocida, matador de plantas. O objetivo era pulverizar a agricultura dos japoneses e levar à fome e rendição. Não chegaram a jogar o DDT nas colheitas porque lançaram bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki. Rachel Carson, em 1961, escreveu Primeira Silenciosa, descrevendo a destruição das matas, rios, lagos e florestas nos EUA.

O livro De Carson levou à proibição do DDT nos EUA, em 1969, não antes da Bayer tentar processo jurídico contra a naturalista.

Vírus, como já escrevi em colunas anteriores, são seres que sobrevivem nas células de animais e plantas. São como máquinas, evoluem rapidamente e mudam em passos acelerados. Vivem em mamíferos de florestas. Com o desmatamento, migram para humanos.

A devastação de matas, de terras para o plantio de monoculturas como a soja (que não é alimento humano) leva a um desastre. No Brasil, disse José Luztemberg, com dinheiro do Banco Mundial, pequenos agricultores assentados em Rondônia, iam deixando para trás áreas devastadas e cortando outras. No Brasil central, o Cerrado deu lugar à plantação de soja, alimento de cães e gado, mas improprio para humanos. São mercadorias que geram lucro às empresas, mas geram também doenças nos locais assolados. É um genocídio cultural e ecológico. São desastres dos tempos atuais.

A criação de gado em massa também devasta. Granjas ou campos de concentração para fabricação de ovos também devastam. Há casos em que as rações das aves contém leite em pó. Leite em pó! Isso coloca as galinhas em competição com os humanos. É chocante.

O que temos? Vírus surgem das metodologias das empresas em produzir para o mercado rápido e voraz, não ecológico, nem sustentável. Perdem suas moradias em outros animais e plantas com a devastação das matas e florestas e avançam em outros corpos. O ministro sabe disso, mas faz palhaçada com as mortes dos brasileiros que já morrem com suas reformas. Imaginem agora privatizar o SUS como ele disse na reunião.

MARTA BELLINI

*Professora aposentada da Universidade Estadual de Maringá. Com doutorado em Psicologia, mestrado em educação e graduação em Biologia, diletante em Literatura, uma ornitorrinco, tem a sorte de continuar a ser integrante do Grupo de pesquisa Science Studies CNPq-UEM, na mesma universidade, grupo interdisciplinar de pessoas da filosofia, pedagogia, biologia, física, psicologia entre outras áreas. Sindicalistas nos períodos necessários, teve a honra de participar com colegas de duas grandes greves, a de setembro de 2001 a março de 2002, e a de abril-maio de 2015, as duas contra privatização das universidades públicas do Paraná e a última, também contra a reforma da previdência, além, é claro, de lutar da dignidade salarial.