Alguma coisa está fora de ordem

Alguma coisa está fora de ordem

A prisão do deputado carioca, do PSL, na noite de terça para quarta-feira desta semana, por insultar o STF em um vídeo, me lembrou o jornalista Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly, o Barão de Itararé, falecido em 1971. Leandro Konder chamou-o de o humorista da democracia, em um livro de 2003.

Amo suas frases. Uma delas, "De onde menos se espera, daí é que não sai nada mesmo", dá o tom para pensar o ministério da saúde.

Outra frase bem bacana é esta, "Não é triste mudar de ideias, triste é não ter ideias para mudar". Pois não é que o deputado encarcerado caiu no conto do vigário? Esqueceu de mudar os ataques, achando que era bonito ser feio, deve ter lido do general confessando o "lavajatismo" do alto comando contra o presidente Lula e resolveu trilhar as ideias do chefe militar. Deu ruim.

Fui ver a biografia do deputado. Resumindo seu percurso profissional, temos uma investigação de anabolizante ilegal em Petrópolis, 70 punições por indisciplina em quatro anos de trabalho e ficou 80 dias de prisão.

Evitou sua expulsão da corporação pela estratégia de licenças médicas. Mais recentemente quebrou a placa em homenagem a Marielle Franco no Rio de Janeiro e, logo após, se meteu em um inquérito das fake news no STF.

Defensor do AI-5 participa de atos pró-ditadura. Como disse Apparício, "diploma não encurta a orelha de ninguém". Evocar, agora, liberdade de expressão para sua defesa é incompatível com a defesa do AI-5. Mas pedir coerência é exigir muito do senhor deputado.

Seguro da impunidade, o deputado pediu o fechamento do STF e deitou injúrias aos ministros. Ora, estava entusiasmado com as frases que leu no livro do general. Mas o general-comandante não vai dar as mãos para seu fiel leitor. General não faz live, nem é youtuber. É tudo feito na quietude das altas cortes. Mais uma vez, nosso Barão explica, "Os vivos são e serão, cada vez mais, governados pelos mais vivos". E o resultado disso, é a prisão e, muito provável, a expulsão do partido.

Resta-me citar mais uma vez Aparício Torelly, "Este mês, em dia que não conseguimos confirmar, no ano 453 a. C., verificou-se terrível encontro entre os aguerridos exércitos da Beócia e de Creta. Segundo as crônicas, venceram os cretinos, que até agora se encontram no governo".

*Marta Bellini

*Professora aposentada da Universidade Estadual de Maringá. Com doutorado em Psicologia, mestrado em educação e graduação em Biologia, diletante em Literatura, uma ornitorrinco, tem a sorte de continuar a ser integrante do Grupo de pesquisa Science Studies CNPq-UEM, na mesma universidade, grupo interdisciplinar de pessoas da filosofia, pedagogia, biologia, física, psicologia entre outras áreas. Sindicalistas nos períodos necessários, teve a honra de participar com colegas de duas grandes greves, a de setembro de 2001 a março de 2002, e a de abril-maio de 2015, as duas contra privatização das universidades públicas do Paraná e a última, também contra a reforma da previdência, além, é claro, de lutar da dignidade salarial.