Entrevista com Odilon Camargo (Artista, Intelectual, Jornalista, Radialista, Pesquisador)

Renan Arnoni – Odilon, conte-me sobre a ditadura em Porto Ferreira

Olá Renan! Buenos dias! Deixa eu responder sua questão de uma forma mais objetiva.

Veja bem, eu não tenho nenhum impulso, nenhum ânimo de falar, especificamente, da ditadura em Porto Ferreira, nas décadas de 60 70, quando estive na Rádio Primavera.

Na década de 70, saí de Porto Ferreira, em janeiro de 1971. Fui para Ribeirão Preto, fiquei lá um ano e depois fui pra Goiânia e fiquei lá 3 anos. Depois, fui para Londres e nunca mais convivi diretamente com Porto Ferreira. Voltei para Porto Ferreira em 2003, 2004 e 2005, em função da doença da minha mãe e, em 2006 ocupei a Casa da Cultura, junto com o Miguel e, inclusive, com minha sobrinha Andreia, durante o mandato de Mauricio Rasi, de janeiro de 2005 até fevereiro de 2006, quando mais uma vez saí de Porto Ferreira. Voltei raras vezes, inclusive, numa destas visitas nos conhecemos, na casa do Miguel. Saí para Tocantins, Araguaína e, depois, Fortaleza.

Então a minha convivência coma a ditadura em Porto Ferreira foi 1964, 65, 66, 67, 68, 6 9 e 70, e eu não tenho muito ânimo, nem muita memória para falar desta época, até porque eu era adolescente.

Mas eu queria fazer uma observação que pode ser útil para as suas pesquisas.

RA – Conte-me mais.

Porto Ferreira, assim como todos os demais 5700 municípios brasileiros, vivem em ditadura desde sempre. Porto Ferreira, se a minha memória ainda estiver funcionando é de 1896. A elevação da vila, do povoado que ficava dos dois lados do Mogi Guaçu. Porto, sempre viveu sob ditadura. O espaço da ditadura militar, de 1964 a 1985, foi a ponta do iceberg. As ditaduras do mundo todo são apenas pontas de icebergs. Você consegue visualizar ditaduras com torturas, atrocidades, barbaridades, crimes de toda ordem, como crimes de guerra. O que o Japão aprontou na China a invadiu e o que os mongóis fizeram há mil anos, naquilo que seria chamado de Europa. São alguns exemplos.

Então a civilização, até aonde nossa memória avança, ela só avança há 4, 5 mil anos. Pesquisadores abnegados e pessoas como você conseguem avançar até 10 mil anos na história. Com muito esforço, arqueólogos e antropólogos conseguem avançar mais um bocadinho, até 11 mil 12 mil anos. Aí a memória já começa a se apagar e tudo virá conjecturas e ilações, né, perdidas nas inscrições das pedras, artes rupestres etc. Registros de até 20 mil anos; inclusive registro que o ser humano tinha a ideia de movimento, animais de oitos patas. Então toda essa história conhecida, que é chamada história da civilização, ela é conhecida como história da ditadura de cabo a rabo, de 10 mil anos até hoje, 2020. Ditadura, ditadura, ditadura.... Não há intervalo. Não há outro momento. O outro momento é "buteco", que o Miguel nem gosta (kkkk); ele nem bebe e outras "cocitas" mais, que não vale a pena citar aqui.

RA – Como você chega a estas conclusões?

Eu faço também meus estudos, porque eu também sou um pesquisador. De um outro jeito pesquiso o mundo pela obra do Fernando pessoa, pela obra do Thomas Morus, pela obra de algumas figuras, como o próprio Dante Alighieri (inferno purgatório paraíso), e por aí vai. Eu faço radicalmente, só eu faço, eu não conheço como jornalista radialista, apresentador de televisão que faça a divisão rigorosa que "humanidade é uma coisa e civilização é outra".

RA – Explique por favor.

Humanidade é uma coisa de 3 milhões de anos. Foi quando nós chegamos aqui no planeta. Está comprovado cientificamente. Durante 2 milhões de anos não houve ditadura. De 800 mil anos pra cá a coisa: "grhhh, grhhh", o ser humano começou a rosnar e depois ficou rosnando mais 100 mil anos, mais 100, até chegar nos últimos 30, 20 mil anos, que já estava uma raça estragada, que virou civilização. Civilização é guerra, é doença é horror é ditadura é posse. Posse de um ser humano sobre o outro, posse da terra. Uma das coisas mais horrorosas é a posse da terra. Nem um metro de terra poderia pertencer a nenhum ser humano, mas nenhum. Isso é axiomático. No momento que o ser humano tomou posse da terra e matou quem tentava viver ali, ficar próximo, a desgraça se instalou, a guerra se instalou a ditadura se instalou. Isso foi quando? 15 mil anos, 30, 50 mil provavelmente. Então a civilização é isso. Posse da terra, posse do outro, o marido é dono da mulher, o prefeito é dono, o governador é dono, o rei é dono, o imperador é dono. Tudo isso é um horror. Por isso eu digo que a história inteira da civilização é ditadura. Não é a ditadura de Porto Ferreira em 1964. Isso é uma bobagem. Há que se aprofundar essa coisa.

RA – Você está falando sobre estruturas de poder. Maquiavel dizia que a política nasce de uma luta de duas classes: entre os que querem dominar e os que não querem se deixar dominar.

É preciso deixar claro que tenho desprezo por uma abordagem simplistas, por um abordagem localizada. Destaco um livro chamado "psicologia da informação e propaganda". Li um livro da década de 70 que falava sobre lenda dos nove desconhecidos, algo milenar, muito antigo. Eram nove livros. Cada um destes desconhecidos cuidariam de um livro. O primeiro livro era exatamente o livro da psicologia e propaganda, que foi o que desgraçou a raça nos últimos milênios. Um chumbo de psicologia informação e propaganda, que tenta provar pra você que Jesus foi crucificado. Na verdade, Jesus não foi crucificado. Toda a história é absolutamente mentirosa. Todos os chamados "livros sagrados" o corão, a Bíblia, deles você tira coisas interessantes, mas a verdade histórica está enterrada em chumbo, porque o que "coiso" tá fazendo lá, em Brasília, que eu chamo hoje poder com um "h", na praça dos Três Poderes, é "phoderes", o que nós estamos vivendo hoje, no Brasil, na América Latina e nos EUA, isso é um horror... é a reta final. Nós como raça já não merecemos mais o planeta.

RA – Estas afirmações entram em conflito com o que as pessoas pensam.

Então quando você falou o "Odilon, vamos falar sobre ditadura em Porto Ferreira década de 60 e 70. Porto Ferreira sempre foi uma cidade de população reacionária. Nada, nada revolucionária, com uma oposição à ditadura militar. E assim Santa Cruz das Palmeiras, Santa Rita do Passa Quatro, São João da boa vista, casa branca, Pirassununga, Araras Leme, a região toda, o Brasil inteiro não se manifestaram contra a tomada do poder dos militares. Mataram estudantes, mataram intelectuais, sacanearam tudo o que era de interessante do pensamento brasileiro. Surrupiaram Paulo Freire o grande educador. Então não é uma questão ligada especificamente a Porto Ferreira. Porto Ferreira não foi nada diferente que a região toda.

RA- Diga-me algo interessante sobre está fase em Porto Ferreira.

Claro que você tem fatos pequeninhos, como eu presenciei a prisão do Professor José Eugênio Colli. Eu assisti. Eu estava na esquina. Ele, de pijama, às 5 manhã, foi colocado no carro, jipe ou viatura, sei lá o que era aquilo do exército de Pirassununga. Mas isso são pequenas coisas.

A população em Porto Ferreira não era nem a favor nem contra a ditadura. Não estavam nem vendo como se diz no Ceará "tô nem rendo, tô nem rendo". O que eu aprendi lá no Ceará, as pessoas colocam o erre em tudo. Enfim é por aí.

RA – Obrigado Odilon pelas suas palavras. Foi um prazer conversar com você. Só gostaria de esclarecer aos leitores que estas são as suas visões de mundo, das quais concordo e discordo e partes. Mas decidi publicar na íntegra para mostrar a sua verdade.